quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

conversa,

conversa, conversa...

olhava os olhos, os cabelos e a boca. inveitável boca. tudo chamando atenção, sabe?

conversa...

como é bom conversar.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

você foi sincera?

digo, foi tudo sincero?
sim, claro.
então não precisa se desculpar. ninguém deve nada mais que a verdade de um sentimento, mesmo que seja por um só momento de indecisão.
e quem é o culpado?
nessa história? ninguém.

o que eu devia pensar

quando todo mar de decisão
me afoga com incertezas?

dias

aprender é difícil
mas recompensa
muito

sábado, 13 de novembro de 2010

o que é o que é?

o que
bob
dylan e
madeleine
peyroux
tem em comum,
levando em conta
meus últimos dias?

domingo, 24 de outubro de 2010

se

os seus conceitos são sempre os mesmos
é o por que você nunca os viveu

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Diário de um idoso

17 de outubro de 2075

Hoje estava andando pela calçada depois de visitar a clínica em que ajustei meu aparelho auditivo. Como todos imaginam, sou um velho de 86 anos muito sozinho. Os que compartilhavam os momentos comigo já estão longe em algum lugar. Pegaram a mala da vida, juntaram cada experiência e se foram. Puf. Fim.

Mas enquanto há fim para alguns, outros ainda estam na mais tenra idade. E foi um destes que eu vi, usando uma camiseta de mangas compridas e vermelhas. O jovem estava lá, parado, esperando o transporte público.

Eu estava muito sozinho e não me parecia ruim a ideia de uma aproximação.

-Você sabe se o Lapa passa ali na Sabesp?
-Me desculpe, mas não sei. Mas olha ali! Tá vindo um Lapa, você pode parar e perguntar, né?
-Isso, isso, obrigado!

Fui e perguntei pro motorista, que balançou a cabeça de um lado para o outro negativamente. Já tinha conversado com duas pessoas aquele dia! Poxa, eu deveria sair mais de casa!

E o estudante, que pela aparência devia seguir alguma carreira de humanas, achou que eu não reparei. Mas percebi que ele estava um pouco abatido. Decidi engatar o papo. Ao virar as costas de novo, para checar qual seria o próximo ônibus, percebi estampado em seu rosto o esboço do que um dia poderia ser um sorriso.

Me senti muito bem com aquela experiência e ele também precisava conversar. Jogar conversa fora, mesmo, nada demais. Eu procurava ser o mais delicado e atencioso possível, atitude recíproca do começo ao fim em nosso contato.

Alisei sua blusa na altura do ombro e não consegui deixar de dizer:
- Você ainda é novo, tem que aproveitar muito. O corpo vai acabando aos poucos. Sobra só a cabeça, e olha que só para alguns! A minha ainda está muito boa!

Uma exclamação repentina da parte dele:
- Eu imagino, mas é essa a parte mais importante de tudo.
Concordei comigo mesmo que não podia alimentar minhas esperanças de conseguir um novo amigo, mas era invitável em razão da ótima condução das palavras. Naquela época, eu não saberia que ele iria gostar de conversar mais, mas hoje, sim.

Hoje eu sei que quando aquele gigante laranja passou e me engoliu ficaram pra trás 21 anos de lágrimas e alguns minutos de experiência de paz.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

voltar

deixo você voar!
o céu já vai abrir...
quais são as cores que fazem toda manhã?
pode nem parecer mas estou sempre aqui
rir do sufoco é tão louco e não cabe em mim
me leve com você
ir pra todo lado só te trouxe até aqui
vou pra qualquer lugar
sei que você também
acima da chuva, vou decolar

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

quando a gente

pega uma daquelas garrafas com um bilhetinho dentro e joga no meio do mar, não esperamos que ela volte.

a resposta foi de um desconhecido, que provavelmente passou por mim e eu passei por ele em porto alegre, no começo do ano; mas não importa, mesmo os desconhecidos podiam sentir um pelo outro aquela sensação de reciprocidade.

era um dos membros daquela coisa maravilhosa, daquele lugar que fazia todo mundo acreditar que era possível ser melhor e ser feliz de um jeito muito diferente.

as palavras dele, mesmo que por internet, marejaram meus olhos e fiquei emocionado.

é quando a gente percebe que alguma coisa acontece...

domingo, 22 de agosto de 2010

129

Daí
Ia
Até
Sentir

que ainda quer muita coisa
e mais nada

domingo, 9 de maio de 2010

H2O

"Ela é branca e brilhante, informe e fresca, passiva e obstinada em seu único vício: o peso; dispõe de meios excepcionais para satisfazer esse vício: contornando, penetrando, erodindo, filtrando.

Dentro dela mesma esse vício também age: ela desmorona incessantemente, renuncia a cada instante a qualquer forma, só tende a humilhar-se, esparrama-se de bruços no chão, quase cadáver como os monges de algumas ordens [...]

Poderíamos quase dizer que a água é louca devido a essa necessidade histérica de só obedecer ao seu peso, que a possui como uma ideia fixa [...]

LÍQUIDO é por definição o que prefere obedecer ao peso e manter sua forma, o que recusa toda forma para obedecer a seu peso. E que perde toda compostura por causa dessa ideia fixa, desse escrúpulo doentio [...]

Inquietude da água: sensível à menor mudança de inclinação. Saltando as escadas com os dois pés ao mesmo tempo. Brincalhona, de uma obediência pueril, voltando logo que a chamamos mudando a inclinação para este lado."

Francis Ponge, Le Parti pris des choses

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Vitrolando

Imagine um disco circular preto com um buraco no meio, feito de plástico. É filho do petróleo. Ele é misterioso. Muitas vezes, se deixados de lado por um tempo, guardados em suas capas, não vão ser conhecidos em essência. Essas são todas as pessoas que passam pelas ruas, que te vendem um pão, algumas que trabalham com você. São pessoas desconhecidas, ou que se fecham, por vontade própria ou não.

Na verdade, não se consegue enxergar nada olhando para um vinil, também. Apenas se chegar muito perto. Dá para ver pequenos sulcos. Essas depressões marcadas mostram quem ele realmente é. Mesmo assim, só com o tocador se consegue extrair algo íntimo, suas notas. Os homens, com suas ideias, procuram entender como se expressar, como expor seu interior para o mundo. Questionam algum sentido nebuloso, obscuro que a sua existência possa ter.

Algumas vezes é difícil de perceber o jeito que se sente à vontade pra isso. Alguns cantam, escrevem, pintam. Outros são ótimos oradores, constroem pontes, educam como ninguém. Cada uma dessas funções funciona como uma espécie de vitrola. Ela pode ser meio estranha, não funcionar perfeitamente. Mas é a melhor forma que qualquer outro poderá conhecer esse ser humano.

Muitas vezes os homens deixam de perceber para onde suas decisões os vão levando. Eles estão desnorteados, rodando e rodando, sem saber qual será a próxima música. Fazem isso por que não descobriram ainda um suporte desses que pode lhes fazer bem. Mas para contrariar a expressão andar em círculos, esse objeto circular nunca gira à toa. Gira somente quando colocado em uma vitrola e nos mostra suas canções. E esse movimento não quer dizer estagnação, mas evolução, transformação.

O tempo também não fica parado em momento algum. É por isso que a cada minuto de rotação, o plástico negro vai sendo ferido pela agulha. As ranhuras podem ficar mais largas, tortas. O chiado aparece, ele já não é mais o mesmo. Cada influência que os homens recebem fará com que tomem outras decisões no futuro. A memória e história de cada um dependem de cada momento. Cada uma montando parte de sua existência.

A vida de um homem se extingue da mesma forma que a música, que o tocador extrai do vinil, cessa. A agulha vai se deslocando, meio atrevida, para onde já não é útil. O centro, ilustrado por um logo colorido, começa a ser riscado e o único som audível é um barulho irritante. O disco acabou.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Júlias

Essa era a terceira Júlia que ele gravava na memória do seu celular. Tinha que diferenciá-la da Júlia prédio e da Júlia, simplesmente Júlia, já que essa era a primeira a passar seu número para ele. Escolheu a sigla da Universidade de São Paulo. USP. Júlia usp. 5 minutos antes pediu 2 reais emprestados para pegar um ônibus para casa. Ela deu 5. Muito obrigado, salvou minha noite! Pode me devolver amanhã ou outro dia. A brasa do cigarro ia acabando lentamente, enquanto a memória ia se avivando.

Tinha visto a Júlia do prédio algumas horas antes em um corredor das ciências sociais. Apesar de tudo, essa era a que ele conhecia por mais tempo, desde a infância. mas perdeu contato por que se mudou e voltou a falar com ela só em 2008 ou 2009, ninguém se lembra ao certo.

A simplesmente Júlia era uma amiga e tanto. Não se viam fazia dois meses, desde quando se despediram para as férias com um abraço perto do portão da vilinha que cortava a rua do prédio. O mesmo da Júlia lá de trás. Sempre se afastavam nas férias, esses dois. Um em Vitória, o outro no interior de São Paulo. Era complicado, mas isso nunca foi grande obstáculo.

Eram companheiros de shows. Ou de conversas a dois em um bar do bairro. Ou também, mas isso faz muito tempo, colegas de ver filme de madrugada, quando nenhum deles tinha que acordar mais cedo. Aqueles eram bons tempos. Menos coisa pra se preocupar e mais a aproveitar. Numa sexta feira de novembro, enquanto bebiam um vinho sul africano, descobriu que ela fumava e confessou: Eu acho até errado falar isso, mas acho que mulher assim ganha um certo charme. E ganha, não ganha? Certamente.

Júlia, em um site qualquer que o Google indicou, significa cheia de energia. Engraçado. Dá muito bem pra lembrar disso quando vem a imagem daquela garota dançando com o vestido que rodava sem pretensão alguma. Isso sem esquecer o jeito com que balançava a cabeça ao som de Eddie, naquele lugarzinho até que apertado da nossa rua Augusta. E tudo isso veio enquanto a fumaça ia se dissipando, com uma última tragada.

Quando voltou pra realidade, apagou o cigarro com o all star fazendo aquela dancinha com o pé e pulou no Perdizes via Miruna com a nota de 5 emprestada.